No tanque do poço, a caminho do moinho da Várzea
Peças em fuga? Não. Memórias muito presentes das férias (grandes) da minha infância. Recordações felizes ligadas ao campo, não obstante eu ter nascido em Lisboa e aí viver. Mas logo que acabavam as aulas, primeiro da minha irmã Linda, 7 anos mais velha, e depois de nós as duas, partíamos, com a nossa mãe, para férias no Casal da Várzea –Sapataria, lugar e freguesia que fica na zona saloia, entre a Malveira e Sobral de Monte Agraço.
O pai não tinha férias, trabalhava por conta própria, e apenas ia passar os fins-de-semana connosco, mas desse período não guardo quaisquer memórias dele. O mesmo não acontece quando, nos meus nove anos, mudámos o local de férias para outro Lugar na mesma freguesia, os Galegos, perto da linha do comboio, e onde, havia uma passagem de nível. E dessa altura recordo aguardar à janela do 1º andar da casa (que o meu pai entretanto alugara), a passagem da automotora às 15 horas de sábado e, com alegria, avistá-lo quando, passada a curva que antecedia a estação, vinha, com a sua pasta, caminhando ao longo da linha do comboio.
-Já depois de publicar estas Memória 1 e quando estava a escrever sobre os Galegos, ocorreu-me uma recordação do meu paqi na Várzea. Eram as nossas "caçadas" aos caracois.Iamos os três (eu a Linda e pai) percorrer os montes da Várzea a apanhar caracois grandes,que procuravamos debaixo das pedras que se amontoavam no meio das terras. Apanhavamo-los para sacos de pano que a nossa mãe nos fornecia, e era bem divertido. Mas tão bom ou melhor, era depois comê-los, feitos com um delicioso refogado que a minha mãe cozinhava, depois de os deixar em farelo, um ou dois dias, para perderem o gosto das ervas.-
Mas são principalmente as memórias da Várzea que me enchem de uma feliz nostalgia. E a Várzea para mim é o Lugar, os trabalhos estivais desenvolvidos pelas pessoas que aí viviam, e estas mesmas pessoas.-
Todos os anos (dos meus 2 aos 8 anos -1949/1955 - e até passarmos a ter casa alugada nos Galegos), os meus pais alugavam uma parte da casa “à época”, a uma das famílias do Casal da Várzea, e consequentemente tinham que levar muitas coisas necessárias à nossa estadia, dado que a casa não estava equipada com tudo o que a família precisaria para ali viver grande parte do período das férias de verão escolares, que nessa altura era de mais de 3 meses e meio.
Aquele Lugar situava-se num dos montes que ladeiam o vale onde se situa a sede da freguesia. Utilizávamos a camioneta da empresa Mafrense, que “apanhávamos” na garagem (como dizíamos), que então funcionava na Av. Almirante Reis, para onde nos deslocávamos de manhã cedo, com certeza, de táxi. Não me recordo claramente dessas deslocações, para além da chegada à “garagem”, e o imenso tempo que demorava a percorrer a distância de 30 Km que então separavam Lisboa do nosso destino. Mas lembro-me bem de uma vez, no regresso, termos perdido a única camioneta que passava à tarde para Lisboa, às 18 ou 19 horas. Então fomos apanhar outra camioneta na Póvoa da Galega, povoação que ficava no percurso e onde passavam outras “carreiras”, designadamente as que vinham da Malveira. E, então, fomos até lá de carroça puxada por burro, carregada de malas, cestos (onde a minha mãe trazia frangas que depois criava no nosso quintal e que para além de nos fornecerem os ovos eram a única criação que comíamos porque a minha mãe desconfiava das condições sanitárias em que galinhas eram mortas e vendidas na praça), e, lembro-me bem, até de colchões.
E concluo que dada a distância da Sapataria à Várzea, que correspondia a cerca de, pelo menos, 30 minutos a pé, a subir acentuadamente, e quantidade de coisas que levávamos e trazíamos cada Verão, deveria ser sempre aquele o meio utilizado para as transportar de e para a camioneta.