Adorava presenciar todas as tarefas associadas à feitura do pão, que na casa da Sra. Maria era feito ao sábado à tarde.
Começava-se com o peneirar da farinha, que vinha do moleiro moída com o farelo. Eram então utilizadas as peneiras que se encontravam penduradas nas paredes da cozinha, divisão térrea de entrada em casa onde se encontrava o forno ao fundo da chaminé, onde também se fazia o lume, a um canto da mesma entre os tijolos preparados para o efeito, para fazer as refeições, que eram tomadas nessa zona da casa, que era o centro da mesma, como, aliás, em todas as casas da aldeia.
Depois de peneirada a farinha (de trigo e de milho, em separado) para os grandes alguidares de barro esmaltado que, depois de lhe ser junto o fermento (pedaço da massa levedada guardado da semana anterior) e água, era amassada braçalmente. Quando esta trabalhosa tarefa era dada como concluída, a Sra. Maria e a Menina Hortense traçavam uma cruz na massa de cada um dos alguidares, tapavam-nos com uns panos brancos muito limpos, e deixavam-na a levedar.
Decorrido o tempo considerado conveniente, procediam então à retirada dos pedaços de massa de farinha que moldavam e colocavam numa pá de cabo comprido para colocar os pães, então formados, no forno, que entretanto fora previamente aquecido com lenha a arder.
Depois de cozidos, os pães eram retirados com a pá e colocados em grandes arcas, envoltos em panos brancos, para irem sendo consumidos durante a semana. Este pão para mim era sempre a maior iguaria do mundo, mesmo com 8 dias!
O farelo amassava-se para fazer pão para os cães, e quando eu era mais crescidinha, e para corresponderem aos meus desejos, aquelas queridas mulheres deixavam que fosse eu a amassá-lo.
Também me davam pedaços de farinha, com os quais eu, radiante, fazia pequeninos pães de trigo e milho, que cozia ao Sol no peitoril da janela.
A Sra. Bernardina, para grande desgosto meu, fazia estas tarefas de madrugada pelo que nunca a podia acompanhar.
Mas da sua casa recordo as noites divertidas, animadas pelas malandrices da minha irmã, a que a Sra. Bernardina correspondia: “ó Sra. Bernardina diga lá otorrinolaringologista”, insistia ela entre as palavras difíceis que queria que a paciente mulher dissesse, e todos nos divertíamos, designadamente o Leonel, com aquelas traquinices a que a Sra. Bernardia correspondia cheia de humor, até desistir de articular palavras enormes que nada lhe diziam.
Outra das tarefas caseiras que eu gostava muito de presenciar era a preparação da comida para o porco, que naquela altura do ano era feita com restos de comida, cascas de batatas e hortaliça cortada. Não sei se ia ao lume nas latas em que era preparada ou se lhe era deitada água quente, mas o cheiro que recordo, parece-me ser daqueles ingredientes meio cozidos.